Como qualquer organização, existe uma hierarquia de poder no condomínio. E, conhecer esta parte do seu funcionamento ajuda muito a solucionar problemas. Para entender melhor, usaremos a mesma ferramenta que é usada pelos Administradores: o organograma. Esta forma de olhar uma organização não é um esquema qualquer, é uma das técnicas mais antigas da Ciência e qualquer outra forma representa uma criação artística. Este foi criado usando a legislação brasileira:
Então, como está apresentado, notamos imediatamente que os condôminos estão na última situação de poder, junto com empregados e empresas terceirizadas. Apesar de parecer estranho, na primeira vista, o que ocorre na realidade é que um único condômino realmente não tem poder nenhum sobre o síndico, empregados e terceirizadas. Em inúmeros casos observados de decisões de juízes, as exigências de um condômino normalmente foram negadas.
O motivo disso é justamente a organização do poder no condomínio é baseada na lei e, pela lei, o poder dentro do condomínio está diretamente relacionada com a capacidade de punir, como veremos adiante.
Assembleia
No topo de um condomínio tem-se a Assembleia que é uma reunião de condôminos com direito a voto obedecendo as regras do Código Civil, Convenção e Regimento Interno. O fundamento do seu poder é que qualquer decisão tomada por uma Assembleia passa a ser uma norma interna punível (de alguma forma) contra quem a não obedecer.
Mas, para que a decisão da Assembleia seja válida, ela deve ter sido convocada por um documento anterior (edital de convocação), dizendo exatamente o que será discutido e votado e deve haver prova de que todos os condôminos receberam o edital em tempo anterior (definido pela Convenção). Então, decisões não incluídas nesse edital, tecnicamente, são inválidas.
É importante saber que a Convenção não é imutável. Poderá ser convocada uma Assembleia para criar uma nova Convenção. Veja o que diz o Código Civil: "Depende da aprovação de 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos a alteração da convenção, bem como a mudança da destinação do edifício ou da unidade imobiliária. (Art. 1.351, Redação dada pela Lei nº 14.405, de 2022)
Do ponto de vista interno, a Assembleia não deve obediência a ninguém dentro do condomínio.
Exemplos
Por exemplo, a decisão de uma Assembleia decidiu algo que muda o que já está descrito na Convenção. Mesmo que tenha sido colocado no Edital, só será válida se for uma Assembleia que tenha a quantidade mínima de votantes (cada Condomínio é um caso, porque as Convenções é que definem isso).
Em outro exemplo, uma Assembleia decidiu pela alteração de disposições da Convenção. Mas, está determinado no Código Civil que “depende da aprovação de 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos a alteração da convenção, bem como a mudança da destinação do edifício ou da unidade imobiliária.” (Código Civil, Art. 1.351., redação dada pela Lei nº 14.405, de 2022).
Nesse caso houve a argumentação que o assunto (forma de uso da piscina) é parte do Regimento Interno. E, realmente, este é um assunto para o Regimento Interno. Mas, neste condomínio, o Regimento Interno foi aprovado como parte integrante da Convenção, como um Capítulo e com numeração de artigos sequencial com o restante. Fazendo um aparte, este é um erro comum quando construtoras aprovam Convenção no ato da constituição sem conhecimento da gestão de condomínios e sem o acompanhamento de um Administrador profissional especializado no ramo. Agora, para alterar a regra de uso da piscina será necessário um quorum de 2/3 dos condôminos, sendo que para alterar o Regimento Interno o processo é muito mais simples.
Comissão Fiscal
Um grupo de pessoas, obrigatoriamente proprietários, deve realizar os trabalhos da Comissão Fiscal. Alguns advogados não são atentos sobre a importância de que as obrigações dos membros do Conselho Fiscal não devem ser delegadas para terceiros, e isso inclui auditores. O conceito que está por trás disso é milenar: o dono deve fiscalizar seus bens. No caso de que a Convenção entenda que deve haver uma fiscalização especializada, isso será realizado por um Auditor, mas sem nunca substituir o trabalho dos membros do Conselho Fiscal.
Esta forma da gestão do condomínio foi determinada por Lei: “Poderá haver no condomínio um conselho fiscal, composto de três membros, eleitos em assembleia, por prazo não superior a dois anos, ao qual compete dar parecer sobre as contas do síndico.” (Código Civil, artigo 1.356).
Note que ao determinar que os membros da Comissão Fiscal somente poderão ser proprietários, nas Convenções de condomínios, não está se ferindo a Lei, mas adequando ao que é recomendado pelos costumes. E, com isso, melhorando a gestão do condomínio.
Por outro lado, a Comissão Fiscal não toma decisões. Sua função é fiscalizar. Dentro da ciência da Administração existem 4 funções: planejar, controlar, dirigir e organizar. A Comissão somente atua na função de controlar realizando a fiscalização (seu papel único definido em lei). Entretanto, muitos condomínios acrescentam funções para o Conselho fiscal e isso não é proibido.
Nosso entendimento, baseado em decisões de juízes, é que a Comissão Fiscal pode contratar pessoas para complementar o seu trabalho, ou seja, ela pode contratar auditores. Mas, há duas situações:
Situação 1: existe previsão anual para este gasto. Deve limitar-se ao valor aprovado.
Situação 2: não existe previsão anual para este gasto. Deve contratar, mas com justificativas suficientes para obter a posterior aprovação pela Assembleia. Se esta aprovar, está tudo em ordem. Se não aprovar, como a contratação foi realizada sem verba, trata-se de gasto não previsto e o contrato poderá ser cancelado.
Em ambos os casos, quem contrata o serviço é o condomínio e, portanto, quem assina o contrato com o auditor é o síndico e ele será responsabilizado pela despesa fora da previsão orçamentária como uma má gestão.
O Conselho fiscal não tem poderes para chamar uma assembleia. O que se entende, com base na Lei, é que ele é uma função acessória da Assembleia. Ou seja, é quem executa a fiscalização de que o que está decidido está sendo cumprindo (tanto decisões de assembleia, como Convenção e Regimento Interno).
Então, nos casos em que há algum problema e que o síndico não está realizando seu papel adequadamente, a Comissão Fiscal pode obter a assinatura de 25% dos condôminos para uma convocação de assembleia. Em casos particulares, que envolvam outras variáveis, o advogado do condomínio deverá ser acionado.
Em uma situação rara, que nunca vi, mas já ouvi falar, algumas Convenções habilitam a Comissão Fiscal para a convocação de Assembleia Extraordinária.
Resumidamente, a Comissão Fiscal é acessória à Assembleia, não tem poder de mando e nem de punição contra ninguém no condomínio.
Advogado
Outra posição digna de nota no Condomínio é o advogado. É mais uma função acessória, sem poder de mando ou de punição contra ninguém no condomínio. O Advogado não tem poderes para convocar uma assembleia.
O advogado tem a função de dar assistência jurídica para o conjunto de condôminos - não está sendo pago para defender ninguém (síndico, conselheiros ou moradores). E, sua escolha deve ser feita, sempre, de um profissional que não pertença, nem tenha relação direta com o condomínio. Ou seja, não pode advogar para o condomínio quem tem relação direta com ele. Saiba mais neste outro artigo "como contratar o advogado'.
Auditor
Assim como o advogado, é uma função acessória, sem poder de mando e deve ser um auditor administrativo independente. O Auditor não tem poderes para convocar assembleia.
É muito importante que o auditor do condomínio seja um Administrador, e não um contador ou advogado. Se o objetivo é auditar a administração, inclusive as contas, um Administrador é profissional correto. Leia mais neste artigo "Porque o auditor do condomínio deve ser um Administrador'.
Por outro lado, se a auditoria é sobre aspectos jurídicos, que o Advogado do condomínio não esteja resolvendo ou não saiba resolver, então é o caso de contratar um auditor jurídico.
E, caso o condomínio invista mais pagando para ter uma contabilidade formal, e precise auditar os lançamentos contábeis, o caso é contratar um auditor contábil. Note que os condomínios não são obrigados a manter contabilidade e as Administradoras não são empresas que prestam serviços contábeis, elas fazem o que se chama de contabilidade gerencial (no máximo) e que não faz sentido auditar, já que não seguem necessariamente as normas contábeis.
Síndico
Esta é a função que detem o poder no condomínio. E, na prática, sua única obediência é com a Assembleia e suas decisões (registradas em convenção, regimento interno e atas). Em toda e qualquer decisão judicial, este preceito é fundamental para sentenças.
Primeiramente, precisamos compreender a situação que ele poderia ser punido: somente a partir de uma Assembleia em que houver aprovação por maioria.
É preciso notar que nem sempre o síndico é o representante do condomínio. Por exemplo, em um condomínio poderá ficar acertado que assinam pagamentos bancários somente o presidente do conselho fiscal e um representante da Administradora. Isso é possivel porque o Código Civil determinou que "poderá a assembléia investir outra pessoa, em lugar do síndico, em poderes de representação' (Artigo 1.348, parágrafo 1).
O síndico deverá convocar assembleias anualmente:
Art. 1.350. Convocará o síndico, anualmente, reunião da assembléia dos condôminos, na forma prevista na convenção, a fim de aprovar o orçamento das despesas, as contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e eventualmente eleger-lhe o substituto e alterar o regimento interno.
§1 Se o síndico não convocar a assembléia, um quarto dos condôminos poderá fazê-lo.
§2 Se a assembléia não se reunir, o juiz decidirá, a requerimento de qualquer condômino.
Também, o síndico poderá convocar em situações extraordinárias, no caso de situações fora do normal, como emergências.
Suas decisões são definitivas e não podem ser revertidas, a não ser por decisão de uma assembleia que será convocada por ele mesmo ou por um quarto de condôminos.
Sobre este último aspecto, recentemente em uma auditoria, um quarto dos condôminos assinou o pedido de assembleia liderados por um dos membros do conselho fiscal. O síndico recusou-se a convocar a assembleia e, então, o advogado do condomínio orientou para que a Administradora emitisse a convocação. Tivemos aqui vários problemas:
1) O síndico não pode se recusar a convocar uma assembleia e o advogado deveria ter agido dentro da Lei, indo até um juiz para obter a convocação judicial. Por outro lado, ao fazer isso, evitou aumentar mais a crise.
2) A Administradora não pode receber ordens de um conselheiro, de uma petição com um quarto de condôminos e nem de um advogado. Ela é contratada para serviços de apoio para a gestão ao condomínio. Se o seu contrato for para Administrar o condomínio, é um contrato nulo, já que a administração do condomínio, por lei, pertence somente ao síndico.
Poderíamos argumentar que o síndico pode repassar para terceiros seus poderes de representação, mas isso não muda que ele, é o único responsável pelos atos praticados também pelos terceiros a quem ele cedeu estes poderes. O mais comum, quando há qualquer problema de gestão é que juízes decidam pela responsabilidade única do síndico, mesmo que a Administradora tenha praticado algum ato ilícito, já que o fez em seu nome.
Subordinados na hierarquia de poder (condôminos, empregados e terceirizada)
Até aqui mostramos o grupo superior ao síndico onde vimos a subordinação direta deste com a Assembleia e que existem funções hierárquicas acessórias que não são subordinadas ao síndico. Ele não pode demitir o advogado, auditor do condomínio e nem depor membros do conselho.
Estes subordinados na hierarquia do poder não podem mandar entre si - não existe essa relação e não deve ser de forma nenhuma incentivada.
Adiante vemos quem são os subordinados ao síndico.
Condôminos
Uma das questões mais comuns em condomínios novos é a suposição que o Síndico existe para incomodar os condôminos que não podem fazer o que quiserem. Isso acontece normalmente em condomínios novos, quando ainda não entenderam que o Síndico é um empregado da Assembleia, mas isso não faz todos moradores seu patrão. Ao contrário, o síndico tem o poder (e dever) de corrigir condutas erradas dos condôminos com advertências e multas - esse é o verdadeiro exercício do seu poder. E uma advertência ou multa só pode ser derrubada por decisão de maioria na Assembleia que tenha este item como um dos tópicos da pauta do edital de convocação. Ou seja, se não cumprir as normas e leis, o síndico irá advertir e multar e, dependendo de cada caso, somente a Assembleia poderá reverter a punição.
Um único condômino não pode tomar para si as pastas e documentos do condomínio, que são de responsabilidade do síndico. Não manda na administradora, no auditor, no advogado. Mas, um grupo de condôminos reunidos em Assembleia, a coisa muda de figura, certo?
Se algum condômino ou morador tiver algum problema, ele deve dirigir-se por escrito a algum membro do conselho ou ao livro de reclamações. Ele não deve agir por sua própria conta, e nem sempre o livro é a melhor opção neste artigo "Livro de reclamações no condominio pode não ser uma boa ideia sempre".
Empregados
Estas pessoas trabalham em contrato de trabalho com o condomínio e seu chefe é o síndico. Não obedecem a ninguém a não ser o próprio síndico. Em casos excepcionais, a Assembleia poderá indicar ao síndico alguma decisão para que este aja com o empregado - a Assembleia não demite ou contrata empregados (exceto o advogado e auditor que podem ser contratados diretamente).
O motivo desta separação em que só o síndico administra os empregados é além da questão da estrutura hierárquica. É uma questão trabalhista: o empregado deve responder somente a um chefe. Isso é indiscutível.
Nosso entendimento é que se um morador der alguma ordem ou serviço para algum empregado, o morador deve ser advertido e multado.
Os empregados devem respeitar os moradores e visitantes, já que estão trabalhando para estes. Mas, isso não significa que podem mandar neles.
Terceirizadas
É comum que os condomínios contratem terceiros para realizar trabalhos para o condomínio. A regra geral é que a contratação é feita pelo síndico e este irá buscar aquela que se encaixe nos seus padrões de qualidade e preço desejados.
Entretanto, algumas questões devem ser consideradas:
1) O síndico contrata quem quiser e pelo preço/qualidade que achar melhor sempre? Não. O correto é que exista antes um critério de seleção que ele deve seguir. Este critério deve ser criado pelo Conselho, que irá fiscalizar o seu cumprimento. Caso não exista, o síndico deve demonstrar a transparência da sua contratação mostrando quais critérios foram usados. Isso deve ser apresentado para a Assembleia, como parte da sua Prestação de Contas anual.
2) O síndico pode delegar tarefas para terceiros, inclusive para apoio administrativo? Sim, isso é previsto em Lei. Mas, quando se trata de Administradora, o que se nota é que o síndico troca a Administradora, mas não há explicação sobre porque trocou por outra. O que ocorre é que (segundo as decisões judiciais), como ele é o responsável pelos atos dos terceirizados (inclusive administradora), ele é quem tem o direito de escolher.
Parece complicado - sugerimos este artigo 'Escolha bem sua Administradora - palavra do auditor de condomínio'.
Conclusão
Como se vê, a organização hierárquica do condomínio é clara, mas tem pesos e contra-pesos. O seu funcionamento é muito parecido com uma empresa bem administrada.
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